Vamos explicar o que significam aqueles números nas cabeceiras das pistas de pouso. Quando falamos em navegação, é comum fazermos uma associação com uma bússola magnética não é?
Uma bússola é um círculo de 360°, onde 360 (ou 000) é o Norte, 90° é o Leste, 180° é SUL e 270° Oeste, onde o sol se põe desolado, como cantou Violeta de Outono.
Ora, se usamos uma bússola para saber para onde nos deslocamos, nada mais natural do que termos a direção das pistas de pouso alinhadas com uma bússola, concordam?
Acontece que uma pista alinhada a 275° Oeste, não vai ter o número 275 pintado em sua cabeceira, já que por convenção a numeração de pista é composta por apenas 2 dígitos. Como fazer então? Bem, a regra é tirar o último dígito e se este for maior que 5, arredondar a dezena para cima. No caso do exemplo, 275° cai o 5 e vira 27. Se fosse 276°, cairia o 6 e arredondaria para o 28 pintado na cabeceira. Para os números pequenos, exemplo, 93°, cai o 3, fica 9 e adiciona-se o 0 (zero) na frente. Entenderam?
O desenho abaixo exemplifica quais números teriam em cada ponta de uma pista alinhada no sentido leste/oeste como Guarulhos:
Mas Lito, eu tô vendo que você colocou o 09 do lado do 270 e 27 do lado que a bússola aponta para 90, fiquei confuso!
Não precisa ficar confuso, como eu disse acima, a bússola aponta para a direção que você segue. Se você está pousando na direção 90, é claro que suas costas apontam para o sentido oposto certo? Além do que, seu avião vai parar lá perto da 27 não vai?
E eu não mencionei, mas acho que está claro para todos que os números de cabeceiras opostas são 180 graus defasados né? Afinal, não existe pista curva, a não ser em condições especiais lá no Congo.
Mas se o número é arredondado, isso não causa problemas pro piloto se alinhar com a pista?
Não, pois as cartas de voo e os instrumentos de navegação dos aviões apontam para a proa magnética (ou real) correta e não para o número arredondado. Exemplificando com a pista de Guarulhos, que é 09/27, as cartas de voo mostram que a pista na verdade é alinhada com a proa magnética de 95°, vejam:

E por que não pintam logo 95 na cabeceira de Guarulhos?
Primeiro porque não é o que combinamos há alguns parágrafos acima, e temos que seguir a convenção, o mundo todo faz igual. E segundo porque a Terra sofre um fenômeno interessante chamado Declinação Magnética, o que pode fazer com que ocorram variações de até 2,5° durante um período de tempo que varia o quanto mais perto você estiver dos pólos. Cidades nos extremos do planeta experimentam variações de até 1 grau a cada 3 anos – haja tinta para ficar pintando número na pista não é? Além disso, imagine a quantidade de alterações em documentos e cartas que teriam de fazer cada vez que mudasse a orientação de uma pista…
Pôxa, mas não é perigoso operar assim perto dos pólos? Como o piloto vai saber quando mudou a direção da pista?
E você acha que já não pensaram em tudo? Aeroportos acima de determinadas latitudes terrestres possuem sua direção alinhada com o norte verdadeiro da Terra, e não o norte magnético. Rá, quando você ia com a farinha os engenheiros e cientistas já voltavam com o bolo.
Estes voos que cruzam os pólos não utilizam bússola magnética, simplesmente porque uma bússola no polo Norte é tão útil quanto uma sunga para os esquimós.
Um exemplo de switch que altera o norte magnético para o norte verdadeiro em uma aeronave já “velhinha” como o Boeing 767:
E para terminar com o assunto de magnetismo, vejam que legal essa figura que mostra a declinação magnética na Terra desde 1600:
Guarulhos possui pistas paralelas, como o piloto sabe em qual vai pousar no sentido leste se as duas serão para ele 09?
Quando o aeroporto possui pistas paralelas, entram o designador L ou R junto com o número da cabeceira. L e R vêm do inglês Left e Right, logo, se o piloto for instruído a pousar na 09R, ele sabe que será a pista 09 da direita.
E se forem 3 pistas paralelas? E se forem 4?
Se forem 3 pistas paralelas, usar-se-ão (sempre quis conjugar verbo assim 🙂 os designadores L, R e C, sendo C de Center ou Central.
Se forem 4 pistas paralelas, como por exemplo o aeroporto internacional de Denver, usa-se um par de pistas L e R e outro par L e R alinhados com 1° a mais (ou a menos), por exemplo 34L, 34R, 35L e 35R.
E para que serve aquela “faixa de pedestre” pintada na frente dos números? Vocês podem atravessar a pé ali?
Qualquer um pode atravessar a pé ali se quiser passar uma temporada na cadeia. Invasão de pista ativa é algo gravíssimo.
Aquelas faixas indicam na verdade a largura da pista, quanto mais listras, mais largura.
As pistas de Guarulhos por exemplo possuem 12 listras, o que equivale a 45 metros de largura. A tabela abaixo mostra a relação entre número de listras e largura.

Mas não é só a “faixa de pedestre” que é pintada nas pistas pelo mundo afora. Há também outras marcas de orientação aos pilotos. Acompanhando esse desenho da FAA, vemos que 150 metros à frente dos números existem duas marcas de 3 faixas de cada lado da linha central para indicar a “zona de toque” (touchdown zone), ou o local onde os pilotos devem tocar as rodas no momento do pouso.
Para se aprofundar mais sobre todo tipo de marcação que tem numa pista, vejam esta página no site do FAA.
E para encerrar, vejam a foto do Google Maps que mostra um A319 (ou A318) na final para a pista 09R de GRU 🙂
Update 18/Fev: Este regulamento abaixo informa que números até 5 arredondam para baixo, mas como GRU tem o rumo 95/275 e arredondou para cima, manterei também minha informação de que 5 arredonda para cima. Tks Bachian.